segunda-feira, outubro 30, 2006

Morro de Amores por Meu Senhor

Morro de amores por meu Senhor.


E Tanto que peço: aniquila-me, Amado.

Joga sobre mim um raio de teu amor

e espalha minhas cinzas sobre os homens,

para que todos saibam como meu Senhor é bom.


É daqueles carinhosos,

que não negam um consolo à amada.

E se prometem dão sempre mais que o prometido.


É pródigo o meu Senhor.


Derrama sobre mim seu amor em torrentes,

abrindo seus longos braços, que me enovelam em seu peito.


Tão quente, ardentíssimo o peito de meu Amado;

que enquanto me abraça, sussurra

(aos meus ouvidos canções as mais belas).


E nem fecho os olhos para ouvi-las;

pois onde encontrar beleza maior que em meu Amado?


Fixo-me em seus lábios,

escarlates como a ferida em meu coração quando se vai.

Escarlates como o sangue que derramaria para tê-lo de volta.


Mas não demora muito o meu Amado;

é cuidadoso, tão solícito o meu Senhor:


vem sempre com um ramalhete nas mãos.


Na última vez, trouxe-me lírios os mais puros,

cândidos como os dentes que quase não se viam quando beijava as pétalas.

“São para o meu amor” — diz o meu Amado.

E quase desfaleço

— não fosse estar a própria minha vida a enredar-me nos braços.


Eu, uma quase meretriz,

que em ausência de seu senhor procura-o por todos os lados.

Mas não o encontrando, satisfaz-se,

não se satisfazendo,

com o pouco que são todos os outros.


Mas já o disse a Ele. E o fiz nestes termos:


“Amor, por que te demoras nas viagens?

Não sabes então que sou fraca

e sem ti corro logo a beber do regato mais próximo?

Não te demores, Senhor!

Que ao menos sempre mandes lembranças tuas,

ó rio cristalino.”


“Vem, vem logo — é o que clamo nas noites.

Vem que tenho sede.

E fecho os olhos a te imaginar.

Mas nenhum pensamento te chega sequer aos pés.

Uns pés que clamo para que me apareçam à frente

e eu os possa banhar com minhas lágrimas e meus beijos.

E com os cabelos enxugar.”


Assim digo ao Amado.

Que sorri aquele seu sorriso.


Não demores, Amado.

Não sabes que sou como meretriz,

que na ausência do senhor corre

a buscar beber do primeiro regato?


Não demores. Tem misericórdia.

E confia em tua amada,

que se esforça em te preparar as melhores iguarias.

Apesar de nenhuma digna de ti.

Pois se delas a maior sou eu mesma?!


Mas iguarias.

Onde se deleita Aquele que as tornou iguarias.


Vem, Amado.


Prova do manjar que te preparo com teu próprio amor.


Amo-te, Senhor. E não te trairia.