segunda-feira, outubro 30, 2006

As Aves

São aves imundas

de imenso negror.

Passeiam aos pares,

centenas, milhares —


miríades de miríades de miríades de aves.


Passeiam em rondas,

agouros, caixões —

um ruflar de asas,

funestos sermões.


São pêlos, não plumas, que orlam, adornam os corpos tufões.


São setas girando,

são dardos gritando,

são bicos sorrindo,

são olhos luzindo.


Os bicos, os bicos — beijam, cortam estes lábios famintos.


Levantam-se aos ares,

abrindo suas fendas.

Recebo suas fezes

em minha garganta.


Corpo após outro visita-me a fenda, me abre, me encanta.


Insone torpor

recolhe meus pés,

me toma lilás,

partindo do ventre.


Raro gemido me toma o corpo, e rio descontente.


Eu rosno, eu grito,

eu abro as asas.

Eu salto e não vôo,

as asas pesadas.


As aves, as aves — onde? As aves. Empurram-me à larga.


Um ventre? Que ventre?

Empurram por dentro,

soltando-se em estalos.

Eu grito, eu calo.


As asas das aves volteiam vermelhas, roxas. Acres.


Os céus são de chumbo.

Os céus são de carne.

Os céus são qual filhos

nascidos em aves.


Meus filhos, meus filhos, são látegos, são bicos. E ardem!


Em nuvem se voltam

à minha pessoa,

me jogam as fezes,

os filhos, as aves.


E eu lambo, e eu como — diluindo-me em intimidades.