segunda-feira, outubro 30, 2006

A Escada de Prata

Ó Amado, faze-me tão feliz...


Lembro-me de quando, mais moça,

bati à tua porta.

Eram uns trajes toscos os que eu usava.

Atendeu-me tua Mãe. Que logo me convidou a entrar.

“Que desejas?” — perguntou-me amável,

uma das mãos ajeitando os cabelos desta que hoje sempre os arruma.

Para ti, Senhor.

“Que desejas?”

“Teu Filho...” — sussurrei.

“Meu Filho?!” — disse tua Mãe, num leve espanto.

“Que desejas com meu Filho? Diz-me.

Ou não confias em mim?” — perguntou num recuo,

os braços assentados nos quadris. — “Diz-me.”

“Estou enamorada de teu Filho, Senhora — pus-me a dizer —,

e sem ele já não vivo.

É aportar o sol à minha janela

e já a escancaro de folha a folha,

postando-me no peitoril.

O vestido que então coloco, Senhora,

é o meu mais bonito:

um de seda, quase nácar.

E o pescoço, umas lindas pérolas são o que o adorna.

Sobre os cabelos derramo seivas as mais perfumadas.

Minhas mãos cheiram a alfazema.

E os olhos... os olhos são fitos em teu Filho.

Que sempre me aparece como príncipe.

Tão garboso, Senhora...

Tem bons modos.

Tira o chapéu e seu cumprimento é o mais doce.

Mais doce até do que um rouxinol.

Não conheço rouxinóis, Senhora.

Mas o é.

Cumprimenta-me e segue o caminho.

Não deixando de olhar vez ou outra.

E diria mais: olha muito. Volta-me sempre o olhar.

Atencioso, educado teu Filho.

E tão forte! Benditos os seios que o amamentaram.

A boca que lhe ensinou tão finos modos.”


E teria dito mais,


não fosse teu Pai a chegar, sorrindo-me atencioso,

o chapéu na mão e o corpo dobrado numa mesura.

Foi-se um átimo;

e já era o meu corpo um se dobrar.

Vi teu Pai e achei que eram tão semelhantes...

Nele te reconheci. E não tive mais coragem.


Estremecida despedi-me e correndo voltei para casa.


Tua Mãe despediu-se e, olhando-me,

antes que eu tivesse saído, puxou-me um dos braços

e disse-me ao ouvido, enquanto me abraçava:
“Volte sempre;

e te ensinarei como conquistá-lo.”


Sorri largamente.

E como teria vergonha de voltar outra vez,

deixei cair o lenço

como pretexto para aparecer em tua casa no outro dia.


Sorris, Amado.

Mas de que sorris?


Não me sussurres, Senhor. Dá-me cócegas.


O quê?!! Já sabias de tudo, então?!


[Pulo para bater-lhe no peito. Mas me abraça e nos beijamos.

Faz-me tão feliz o meu Amado!...]