segunda-feira, outubro 30, 2006

A Faca

A faca

é lâmina,

é vítrea.

Se espessa,

é mínima,

aguda.


Apóio-me

inteiro

no fio

e corto

a carne,

seus talhos,

as folhas

vermelhas

e fundas,

tiradas

do caule,

de carne,

a um tempo

bem quente,

bem úmida.


Intenso

caminho

no fio

e mancho

os pés:

rubor;

uns gritos

de prata;

a pele,

que fina

se rasga.


Um corvo,

de bico

no vinho,

tão ébrio,

faz vezes

de hiena,

cantando

um canto

que talha,

de talhe

bem fundo,

os ares,

mantendo

em grito

suspenso

tal feito

da triste

cantiga

que faz

que eu pise

mais forte

o fio,

a lâmina

de corte.


Além,

teria

um rio,

um prado,

um canto,

um lar.

Uns olhos,

um belo

sorriso,

candente,

por sobre

o mar,

e além,

e dentro,

e em torno,

bem antes,

também

depois,

ali,

após

a lâmina,

que agora

eu piso

e repiso,

cortando

a carne,

a pele,

em tiras

por sobre

a prata.

A pele,

que grita,

que dói.


As lágrimas

me caem

dos olhos,

ardendo

na face

gretada.

Um sol

me lambe

um lado;

e o outro

é treva,

mais nada.

Também

é braços

puxando-me

a veste ,

o corpo,

minh’alma.


Eu sinto

o fio

da lâmina:



a vítrea,

aguda,

salgada.